No vidro da minha janela adivinham-se por vezes reflexos que parecem tentar jogar ao sério comigo. Se me concentrar no silêncio circundante, começo a distinguir as vozes que deles se vão desprendendo, quase como se fossem murmúrio das árvores nuas em noite ventosa. Aconteceu já ver um rosto, ou talvez mesmo só um olhar e pela beleza e sensação de bondade, não sentir a mais pequena inquietação ou medo. Depois racionalizo e digo para mim que são os reflexos provocados pelo suave ondulado da superfície do vidro da janela. Mas as vozes, cantando doces embalamentos, como se convocassem meus sonhos... Imaginação? ilusão de acústica? Uma destas noites, ouvi pela primeira vez, não o calmo murmúrio, mas claramente as palavras "Entrega o teu olhar e verás mais longe". Seria sonho? Alucinação? Não sei. Não tenho visto os meus reflexos de estimação. Gostava de os ver, de os ouvir de novo. Se voltarem a aparecer, gostaria de lhes perguntar algumas coisas. Será que respondem?
quarta-feira, 24 de outubro de 2007
segunda-feira, 22 de outubro de 2007
Antes de adormecer
Deitamo-nos com o mínimo luar que nos murmurava uma canção de embalar. Novos horizontes aguardavam a escuridão do sono, como a tela ansiando a tinta. Senti a carícia da tua mão no meu rosto e não me lembro de mais nada.
Ela olhava para ele, para a sua gentil perfeição. Sabia-o seu para sempre e respirava a vida tranquila, plena. Imaginava pequenas histórias sussurradas no ouvido dele e deliciava-se quando um sorriso era esboçado. Ela estava feliz e sentia-o, sabia-o, saboreava-o feliz. Por fim adormeceu também, embalada pela lua e pela saciada respiração dele.
segunda-feira, 15 de outubro de 2007
Sem título
A minha sombra projecta-se aqui um pouco independente de mim, delineando cantos antes não apercebidos. Este é o meu espaço e tu convidaste-me para lá. Como suportas o meu peso com teus pés? Por momentos, senti que eras tu a dirigir-me, serpenteando por entre as pontas de cigarros. E quando me sinto no mais improvisado abandono, é contigo que falo, embora nunca respondas, mas sei porque o fazes: queres sempre que seja eu a encontrar respostas no teu negrume.
Minha sombra...Digo eu.
Meu corpo...dizes tu.
Quando sinto que o mundo está ao contrário, escondo-me em ti. Sempre tiveste essa generosidade. E quando de ti me fazes de novo emergir, faço-o com renovado desejo de enfrentar a minha própria criatividade, deixando-a seduzir-me. Aí, tudo é luz e sabes o que isso quer dizer...Penso eu, com um sorriso nos lábios. Andas por perto.
terça-feira, 9 de outubro de 2007
Sintoma
As longas esperas por trás da porta,
com um olho no que se passa para lá da janela.
E é a chuva a estatelar-se nos vidros,
a gerar dentro a aquecida memória
a enrolar-se feita caracol
no qual o pescoço se aconchega.
Jugular é palavra que não ocorre nestes momentos.
Mas às vezes pensa-se, pergunta-se
sobre a razão entretanto esquecida de estar ali.
E podem passar-se anos, vidas até a imagem
se deter, qual suspense de slotmachine.
Tudo é possivel antes de parar.
com um olho no que se passa para lá da janela.
E é a chuva a estatelar-se nos vidros,
a gerar dentro a aquecida memória
a enrolar-se feita caracol
no qual o pescoço se aconchega.
Jugular é palavra que não ocorre nestes momentos.
Mas às vezes pensa-se, pergunta-se
sobre a razão entretanto esquecida de estar ali.
E podem passar-se anos, vidas até a imagem
se deter, qual suspense de slotmachine.
Tudo é possivel antes de parar.
domingo, 7 de outubro de 2007
As árvores vulgares
De todo um intrincado sistema
pode desprender-se o murmúrio
por entre os espaços vazios
das árvores.
E todos os aflitos receios da infância
brotam à flor da pele,
soprados por clarins nocturnos,
escutados à distância,
pelos troncos dos pinheiros.
Eles escondem o balanço dos dias
em sazonais cumplicidades.
Sonhei-as assim, as árvores ausentes,
recordações das manhãs de domingo.
O que já lá não está, mas perdura.
pode desprender-se o murmúrio
por entre os espaços vazios
das árvores.
E todos os aflitos receios da infância
brotam à flor da pele,
soprados por clarins nocturnos,
escutados à distância,
pelos troncos dos pinheiros.
Eles escondem o balanço dos dias
em sazonais cumplicidades.
Sonhei-as assim, as árvores ausentes,
recordações das manhãs de domingo.
O que já lá não está, mas perdura.
quinta-feira, 4 de outubro de 2007
Deêm-me um pouco de amanhã e serei feliz.
Hoje vou sorrir meu melhor e alegre sorriso, contar as estrelas na minha imaginação e dar graças por estar vivo, por viver a felicidade e mágoa do quotidiano. Vive-se com a cabecinha pejada de mitos e frases feitas, aguardamos príncipes e princesas encantadas, procuramos desesperadamente agarrar o momento... Enfim, artifícios para não sermos aquilo que nascemos para ser: nós próprios. Ser a minha própria pessoa...Mas que coisa tão enganadoramente simples de ser. Nestes últimos tempos, tenho ouvido muito a referência ao momento, vamos agarrar o momento, nada mais temos que o momento, o momento é nosso... De que me serve viver unicamente o momento se não tiver uma noção do que será o amanhã? Apenas viverei plenamente o momento, se estiver de algum modo tranquilo em relação ao dia seguinte. Estaremos condenados a não ser felizes? Não, porque temos o momento. Que contradição... Do mesmo modo que, apenas olhando para trás na nossa vida, enquanto vemos talvez fotos da juventude, é que nos apercebemos de todas as possibilidades que se ofereciam à nossa frente. Umas vezes estamos adiantados, outras estamos para trás, mas raras vezes sabemos que a corrida é com nós próprios.
Quem sabe?
Paixão quente,
coração dormente,
labirinto demente,
mapa na ponta de um alfinete
cravado na minha pele mais sensível.
Para que lado a saída?
Como saber, de olhos fechados?
Andar de um lado para o outro,
sem deixar sarar a ferida.
Coçar a dor, coçar o desamor,
sem nunca encontrar a saída.
Olha, um girassol.
Vou fazer mal-me-quer, bem-me-quer.
Com todas estas pétalas a mais...
Tão amarelas, tão vestais.
Quem sabe a sorte que me poderá bater.
Nova promessa
De um amanhã não parido, para um presente não aberto, eu envio as minhas saudações. Outro dia nasceu e da viscosa madrugada pingou o néctar da nova promessa e o aconchegante aroma invadiu a cidade inteira. O horizonte curvou-se como que sorrindo, num convite à aventura. Se por acaso me encontrares por aí, ofereço-te o calor de um abraço, digo-te que foi bom reencontrar-te e depois sigo o meu caminho.
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